Entre tradições e crenças

Até que ponto nosso sonho de um lugar melhor não poderia nos levar a fazer algo inacreditável?
O thriller psicológico A Vila trata dessa questão, principalmente, e também do quanto nossas crenças podem ser o motor das nossas atitudes, sejam elas ligadas ao que consideramos ético e moral, seja pela esperança de um mundo sem maldade.

Na história, conhecemos uma pacata vila arcaica, onde um grupo de pessoas vivem em harmonia com o que produzem, bem como uns com os outros. Nessa vila, todos têm suas casas e seus afazeres coletivos, como a limpeza, coleta de alimentos, educação dos menores e guarda, assim, logo nos perguntamos a necessidade de uma guarda, já que tudo parece a mais perfeita paz.
Só que nos primeiros momentos a nossa dúvida é respondida. Acontece que nos arredores dessa vila vivem criaturas misteriosas e sanguinárias, que, por causa de uma trégua estabelecida anos atrás, não chegam perto dos limites da vila. Porém, coisas estranhas começam a acontecer no lugar, quando animais aparecem mortos e escalpelados, e as criaturas não mais estão respeitando o acordo.

Nesse meio tempo, a morte de um jovem rapaz, por causa de uma misteriosa doença, balança Lucius (Joaquin Phoenix), que decide pedir ao Conselho dos Anciões permissão para atravessar a floresta e chegar a cidade, onde poderá pegar medicamentos, caso aconteça uma repetição dos eventos. Preocupado que a doença possa se espalhar, ele passa a questionar o posicionamento do conselho de não deixá-lo sair da vila.
Os dois acontecimentos se misturam e é aí que o filme realmente fica instigante
Para começar, o roteiro é todo centrado na dúvida e, ao mesmo tempo na certeza dos eventos sobrenaturais que envolvem a vila e os seus arredores. Também não é claro, pelo menos de início, quando a história se passa, de modo que o fator cronológico não é importante, tornando as crenças daquelas pessoas e o seu comportamento 'ultrapassado' completamente críveis e de acordo com o caminhar da narrativa. 
Depois, temos uma  câmera invasora, que nos vai adentrando nas histórias de cada um dos personagens importantes para o desenvolvimento da trama e é, justamente pela forma como a câmera se insere na cena, que temos a sensação de que estamos invadindo um espaço pessoalParadoxalmente, por esse mesmo movimento de invasão, ficamos com a forte impressão de que não conheceremos os segredos deles completamente, bem como não nos tornaremos íntimos de suas psiquês, de modo que somos "expulsos" dos espaços o tempo todo. A direção de M. Night Shyamalan (de O sexto sentido, Sinais e A Visita) só reafirma a dubiedade das imagens e do enredo, uma vez que ele é responsável por filmes com vários plot twistes e com diversas surpresas, sendo A Vila não diferente disso. 

A falta de tempo definido é ressaltado pela fotografia do filme, que opta por enquadramentos mais contemplativos e tomadas um pouco mais longas, além de não parecer se importar em enquadrar seus personagens sob regras claras, sendo que eles, muitas vezes, ocupam o quadro inteiro, ou em outros momentos, estão quase fora dele. Durante uma das muitas reviravoltas do plot central, podemos supor um período para encaixar-lhe, mas o genial nesse momento é o de perceber que, assim como na vida, o tempo pode ser expandido, reduzido e até mesmo reposicionado.
Momento de ressaltar as atuações protagonistas, que passam veracidade e potência no enredo central. Bryce Dallas Howard, Adrien Brody e Joaquin têm uma química surpreendente, que ganha potência nos enquadramentos escolhidos, passando como cada um dos personagens é enfatizado pelos seus aspectos mais importantes, como sua sanidade, sua timidez, sua perspicácia, sua autonomia, sua paixão e sua índole. Destaque para Adrien, que faz um doente mental e que potencializa todas as questões trazidas pelo filme.

Aproveitando o gancho sobre índole, no longa é questionado, mesmo que de modo secundário, se a índole é inata ou adquirida e isso pode ser a perfeita deixa para perguntar uma vez mais se seríamos capazes de qualquer coisa por um utopia.
P.S - Esforcei-me muito para conseguir trazer uma resenha que não tivessem spoilers e foi bem difícil, pois o filme é basicamente em cima de acontecimentos muito específicos. Assim como Sinais e O Sexto Sentido, A Vila é um filme para se ver uma vez, já que depois que esses momentos são revelados, você não consegue mais se surpreender. 

A Vila está na minha lista de 24 filmes para 2016, proposta pelo Blogs que Interagem, na categoria Portador de Deficiência.

Um comentário

Monique Dieli Chiarentin disse...

Assisti esse filme quando eu estava no terceiro ano, na escola e lembro de ter ficado com medo nas cenas de suspense (sou muito medrosa shuhsuasahusa) e de me surpreender no final.
É um bom filme com uma reviravolta que te deixa pensando "WHAT ?" shushaushash

Amei a resenha!

Beijos
Inverno de 1996